
Por Francisco Tramujas
Por trás de cada história de sucesso empresarial existe sempre uma linha tênue entre confiança e arrogância. Quando uma empresa cresce, domina mercados e se torna referência, é natural que surja a tentação de acreditar que o passado garante o futuro. Mas é exatamente nesse ponto que muitas marcas cometem o erro fatal: ignoram os sinais claros de transformação do mercado, os novos comportamentos do consumidor e os avanços tecnológicos que mudam as regras do jogo.
No Capítulo 9 do meu livro O Marketing Estratégico para Revolucionar Mercados, Pessoas e o Mundo, analiso como a soberba estratégica levou à queda de marcas que pareciam inquebráveis. Blockbuster, Blackberry e inúmeras outras gigantes não foram derrotadas apenas pela concorrência, mas pela própria cegueira gerada pelo sucesso.
A Ilusão da Invencibilidade
Empresas que lideram um setor muitas vezes acreditam que seus modelos de negócio são à prova de mudanças. Essa visão cria o fenômeno que Theodore Levitt chamou de miopia de marketing: quando gestores se enxergam como parte de um setor específico (videolocadoras, filmes fotográficos, celulares com teclado) em vez de enxergar a necessidade real do consumidor (entretenimento em casa, memória emocional, comunicação simples).
Blockbuster acreditava estar no ramo de locação de filmes. A Netflix entendeu que estava no ramo de conveniência e entretenimento sob demanda. A Kodak se via como fabricante de filmes, quando na verdade deveria ter entendido que sua essência era a preservação de memórias. Esse descompasso é o que transforma gigantes em ruínas.

O Caso Blockbuster: O Preço da Soberba
Nos anos 1990, a Blockbuster era um império. Mais de 9 mil lojas, presença global, um modelo consolidado. Quando a Netflix surgiu oferecendo DVDs por correio e, depois, streaming, os executivos da Blockbuster riram da ideia.
Em 2000, tiveram a chance de comprar a Netflix por apenas 50 milhões de dólares. Recusaram. Dez anos depois, a Blockbuster faliu, e a Netflix vale hoje centenas de bilhões.
Por que a Blockbuster não enxergou? Porque estava confortável demais com as multas por atraso, que representavam uma fatia enorme de sua receita. O que para ela era lucro, para o cliente era dor. E onde há dor, sempre haverá espaço para disrupção.
BlackBerry: Da Glória à Relevância Zero
Outro caso emblemático é o da BlackBerry. Nos anos 2000, era símbolo de status corporativo. Seus teclados físicos eram adorados, e executivos não se viam sem o “BB” no bolso. Quando a Apple lançou o iPhone em 2007, com tela sensível ao toque e acesso facilitado à internet, a BlackBerry riu. Apostou que seu público jamais abandonaria o teclado físico.
O que aconteceu? A Apple redefiniu o que significava “ser conectado”. O smartphone deixou de ser uma ferramenta de e-mails corporativos para se tornar uma extensão da vida social, do lazer, da música, da câmera fotográfica. A BlackBerry foi lenta, arrogante e descrente da mudança. O resultado foi a irrelevância.
O Viés do Sucesso Passado
No meu livro, conecto esses fracassos ao que a psicologia chama de viés de status quo: a tendência de acreditar que o que funcionou até agora continuará funcionando. Gestores de empresas líderes acreditam que têm “imunidade” às mudanças, porque seus resultados atuais confirmam sua visão.
Jim Collins, em How the Mighty Fall, descreve isso como a primeira etapa da queda das grandes companhias: a arrogância do sucesso. A empresa acredita que sua fórmula é única, inimitável e permanente. É justamente nesse momento que se torna mais vulnerável à disrupção.
Porter, Collins e a Arrogância Estratégica
Michael Porter já alertava que não há estratégia eterna. Vantagens competitivas precisam ser constantemente revistas, pois a concorrência copia, a tecnologia evolui e o consumidor muda. Estratégias que funcionaram em um cenário podem ser inúteis em outro.
Jim Collins, por sua vez, destaca que empresas vencedoras são as que cultivam humildade disciplinada. Não se trata de falta de ambição, mas de reconhecer que o mercado é maior que qualquer ego corporativo. Blockbuster e BlackBerry erraram justamente por acreditar que sabiam mais que seus consumidores.
Jack Welch também dizia: “Quando a taxa de mudança interna é menor que a taxa de mudança externa, o fim está próximo.”. Essa frase resume o destino das marcas arrogantes.

O Papel do Consumidor na Ruína
Vale destacar: não foi a Netflix que “matou” a Blockbuster. Não foi a Apple que “matou” a BlackBerry. Foram os consumidores que migraram para experiências mais convenientes, mais simples, mais conectadas. Empresas morrem porque deixam de escutar o cliente real e passam a escutar apenas a própria narrativa de sucesso.
No Capítulo 9, ressalto que toda marca corre o risco de criar uma “bolha de ilusão”, onde executivos falam entre si, mas deixam de ouvir o shopper, o usuário, o cliente final. Essa bolha é confortável, mas letal.
Lições para Evitar a Arrogância
A história das marcas que quebraram traz lições que devem ser revisitadas por todo gestor e marqueteiro:
- Reinvente-se antes de precisar. Espere demais e o consumidor já terá migrado.
- Escute as dores do cliente. Onde há insatisfação, há oportunidade de disrupção.
- Não confunda liderança com invencibilidade. O topo é apenas o início da queda se não houver adaptação.
- Teste constantemente. Marcas que experimentam mantêm contato com novas realidades.
- Pratique a humildade estratégica. O passado é inspiração, não garantia.
A arrogância é o câncer das grandes marcas. Blockbuster, Kodak, Nokia, BlackBerry — todas acreditaram que sua força de mercado as protegeria das mudanças. Todas ignoraram sinais claros. Todas sucumbiram.
Como escrevo em meu livro, não são apenas empresas que quebram. São histórias de soberba empresarial que poderiam ter sido evitadas com humildade, inovação e foco genuíno no consumidor.
A pergunta que fica é: sua marca está ouvindo o mercado ou apenas repetindo para si mesma a história do passado?
Empresas que confundem liderança com invencibilidade estão assinando, sem perceber, sua própria sentença de morte.
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